EUA querem 183 mil imigrantes monitorados com tornozeleiras eletrônicas, diz jornal

Organizações denunciam maus tratos em prisões para imigrantes nos EUA

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O Serviço de Imigração e Alfândega dos EUA (ICE) quer que 183 mil imigrantes passem a ser monitorados com tornozeleiras eletrônicas, segundo o “The Washington Post”.

De acordo com o jornal americano, em um memorando de 9 de junho, o ICE orientou seus funcionários a aumentar o número de estrangeiros rastreados – atualmente são 24 mil – e ordenou que todas as pessoas inscritas no programa Alternativas à Detenção, oferecido pela agência, tivessem o equipamento instalado “sempre que possível”.

Cerca de 183.000 migrantes adultos estão inscritos no ATD e já haviam consentido com alguma forma de rastreamento ou check-ins obrigatórios enquanto aguardavam a resolução de seus casos de imigração.

“Se o estrangeiro não estiver sendo preso no momento da denúncia, aumente o nível de supervisão para monitores de tornozelo com GPS sempre que possível e aumente os requisitos de denúncia”, escreveu Dawnisha M. Helland, diretora assistente interina na área de gestão de imigrantes não detidos, na carta.

Ao Post, a porta-voz do ICE, Emily Covington, não comentou o memorando, mas disse que o governo está usando tornozeleiras eletrônicas como uma “ferramenta de fiscalização” para garantir o cumprimento das leis de imigração e que “mais responsabilização não deveria ser uma surpresa”.

Em post na rede social X, nesta quinta-feira, Tricia McLaughlin, secretária assistente do Departamento de Segurança Interna dos EUA, compartilhou a reportagem e afirmou que, quem não quiser se submeter ao monitoramento, pode deixar os Estados Unidos.

“Sim. Se você estiver ilegalmente nos Estados Unidos, poderá ser “algemado” com um monitor de tornozelo GPS. Se não quiser usar um, você deve deixar o país agora mesmo”, escreveu.

imigrantes e seus defensores criticam, há muito tempo, o uso pelo governo das volumosas tornozeleiras pretas, que, segundo eles, são fisicamente desconfortáveis, impõem um estigma social e invadem a privacidade das pessoas que as usam, muitas das quais não têm antecedentes criminais ou histórico de faltas a audiências judiciais.

“Esta será uma ferramenta usada para ampliar o alcance do governo, que vai além de apenas as pessoas que ele consegue deter fisicamente, para centenas de milhares de outras que ele pode vigiar. Ela foi projetada para transformar suas próprias comunidades e lares em gaiolas digitais”, afirma Laura Rivera, advogada sênior da Just Futures, uma organização sem fins lucrativos que realiza pesquisas sobre tecnologias de rastreamento do ICE.

Agentes do Serviço de Imigração e Controle Alfandegário dos EUA (ICE, na sigla em inglês) prendem imigrante nos EUA. — Foto: Reuters/David Gray/File Photo

Agentes do Serviço de Imigração e Controle Alfandegário dos EUA (ICE, na sigla em inglês) prendem imigrante nos EUA. — Foto: Reuters/David Gray/File Photo

Uma hondurenha de 29 anos, mãe de dois filhos, foi intimada a instalar uma tornozeleira no mês passado. Em espera pela resposta a seu pedido de asilo, ela garante que compareceu a todas as suas audiências e cumpriu seus check-ins obrigatórios no aplicativo móvel do governo, mas mesmo assim passou a ser monitorada sob o argumento de que agora existem “novas leis”.

“Talvez tenham tomado essas medidas drásticas porque muitas pessoas não comparecem ao tribunal ou mudam de endereço sem se apresentar.Mas alguns de nós fazemos tudo certo e ainda assim somos tratados da mesma forma”, disse ao The Post sob a condição de anonimato, pois teme represálias por parte de autoridades governamentais.

Dados de saúde para buscar imigrantes

Há uma semana, a agência de notícias norte-americana Associated Press noticiou que o governo de Donald Trump vai fornecer a autoridades do ICE os dados pessoais de todas as pessoas beneficiadas pelo Medicaid, o programa de saúde pública dos Estados Unidos.

Até o endereço de todos os 79 milhões de inscritos no programa de saúde será fornecido.

O banco de dados revelará aos funcionários do ICE os nomes, endereços, datas de nascimento, informações étnicas e raciais, além dos números do Seguro Social de todas as pessoas inscritas no Medicaid.

O programa, financiado pelo governo federal e pelos estados dos EUA, oferece cobertura gratuita para serviços de saúde para as pessoas mais pobres, incluindo milhões de crianças — os Estados Unidos não têm um serviço de saúde pública universal, como SUS brasileiro.

O acordo foi assinado na segunda-feira (14) entre os Centros de Serviços Medicare e Medicaid e o Departamento de Segurança Interna, mas não foi tornado público.

“O ICE usará os dados do CMS para permitir que o ICE receba informações de identidade e localização de estrangeiros identificados pelo ICE”, diz o acordo.

O ICE é a agência do governo norte-americano que tem caçado e prendido milhões de imigrantes ilegais que residem nos Estados Unidos, seguindo uma promessa de campanha de Trump. O presidente norte-americano vem pressionando o ICE a deter 3.000 estrangeiros por dia ao redor do país.

EUA: Prisões de imigrantes triplicam em alguns estados

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Congressistas consultados pela AP e inclusive funcionários do Medicaid contestaram a legalidade da transferência de dados. E alertam para um possível alarme generalizado entre pessoas que buscam atendimento médico emergencial — um dos serviços cobertos pelo Medicaid.

Outros esforços anteriores do governo Trump para reprimir a imigração ilegal já fizeram com que escolas, igrejas, tribunais virassem locais perigosos para imigrantes e até mesmo para cidadãos norte-americanos que temem ser presos por engano em uma operação do ICE.

A secretária assistente do Departamento de Saúde dos EUA, Tricia McLaughlin, afirmou que as duas agências “estão explorando uma iniciativa para garantir que imigrantes ilegais não recebam os benefícios do Medicaid destinados a americanos cumpridores da lei”.

“Eles estão tentando nos transformar em agentes de imigração”, disse um funcionário do CMS, sob anonimato.

O acordo não permite que os funcionários do ICE baixem os dados. Em vez disso, eles terão acesso a eles por um período limitado, das 9h às 17h, de segunda a sexta-feira, até 9 de setembro.

Imigrantes que não residem legalmente nos EUA não podem se inscrever no programa Medicaid. Mas a lei federal exige que todos os estados ofereçam o Medicaid emergencial, uma cobertura temporária que paga apenas por serviços que salvam vidas em salas de emergência para qualquer pessoa, incluindo cidadãos não americanos.

Por isso, o Medicaid emergencial é frequentemente usado por imigrantes, incluindo aqueles que estão legalmente presentes e aqueles que não estão.

Muitas pessoas se inscrevem no Medicaid emergencial em seus momentos mais desesperadores, disse Hannah Katch, ex-assessora do CMS durante o governo Biden.

“É impensável que o CMS viole a confiança dos inscritos no Medicaid dessa forma”, disse Katch. Ela afirmou que as informações de identificação pessoal dos inscritos não foram historicamente compartilhadas fora da agência, a menos que para fins de aplicação da lei para investigar desperdício, fraude ou abuso do programa.